domingo, 16 de outubro de 2016

no limbo do domingo

Fotografia: Maria Isabel Mota
Domingos são aqueles dias de limbo, entre o lazer do fim-de-semana e a preparação para a agitação de um novo ciclo de trabalho. Entre o passado e o futuro, a pausa e a acção.
Aqui e agora, são momentos de escolha, de decisões, de karma (acção) a determinar os efeitos que se seguem.
Grandes oportunidades de crescimento pessoal e espiritual surgem logo na sexta-feira (viernes, vendredi ou o dia de Vénus), em que termina o trabalho e se corre para o oposto, o prazer; sábado (dia de Saturno), em que se descansa e se maturam as ideias e os sentimentos pessoais; e domingo (sunday), o dia do Sol e do reencontro com a lucidez e a acção.
Nada melhor do que um dia nublado e preguiçoso para nos presentear com a tranquilidade necessária para preparar mudanças. E o auxílio da fase da Lua para completar o processo.

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

excessos e conflitos

Fotografia de Maria Isabel Mota
O conflito nasce sempre da noção que temos de estarmos separados. Como indivíduos, como corpos diferentes, é difícil lembrarmo-nos de que pertencemos todos à mesma consciência, ou ao mesmo material divino, poderoso e ilimitado.
Quando o conflito surge, o alerta é para a demonização que estamos a fazer do outro, ou dos outros. Não nos vemos como indissociavelmente ligados, a outra escala, e que a beleza está em, apesar da possibilidade da experiência pessoal, não deixarmos de ser um.
A extrema identificação com alguma coisa é sempre uma limitação. Um clube de futebol, um país, uma região, uma raça, uma religião, têm balizas definidas que as separam das outras coisas. E nessas balizas não cabem mais do que alguns pormenores.
É um erro confundir algumas identificações com o potencial ilimitado de que dispomos. E essas identificações excessivas, pouco dispostas à maleabilidade, é que suscitam o conflito. 
Assim como as rochas que, com a sua aparência de invencibilidade, se sujeitam à erosão de ventos, águas e areias, também sofremos na pele o desgaste dos limites que nos impomos. No final, como as rochas, desfazemo-nos no pó e no resto dos elementos, voltando à natureza que nos deu corpo, mais uma vez parte indissociável do todo.
Devíamos entender o conflito como a nossa resistência ao entendimento do nosso papel no conjunto das coisas. E ter a coragem de alterar de imediato a nossa postura, para eliminar o sofrimento e o desgaste em que nada se ganha.
Pensar ainda que, como consciência colectiva, não é só a nós que prejudicamos com os nossos limites. Como uma infecção, contaminamos tudo à nossa volta. Inocentes, espectadores passivos e quem participa do conflito. Todos perdemos.
Evitar o conflito é assumir que os resultados jamais serão os que esperamos, uma vez que não há acordo possível. Não será então mais inteligente prescindir dos limites excessivos e rendermo-nos a uma paz sem sofrimentos adicionais?

sábado, 1 de outubro de 2016

memória

fotografia de Maria Isabel Mota
O teu medo diz-te que o teu ponto de atracção não inclui o desejas. (Abraham-Hicks)

A memória não é tudo o que somos. Nem sequer é fiável, porque se mistura com a imaginação para preencher as lacunas que o tempo vai deixando. É uma gaveta onde guardamos fragmentos de coisas que depois nos aparecem desligados de outros contextos que não as emoções que nos suscitam.
Ainda por cima está deslocada no tempo. Nunca se refere ao presente, que é o sítio onde estamos agora e devemos viver. E sendo um punhado de fragmentos, a razão porque insistimos em nos identificar com ela é apenas por ser uma espécie de âncora da nossa existência. Uma base de dados, um caderninho de apontamentos para não nos esquecermos de que estamos nesta vida.
São notas que não temos de repetir, embora isso nos pareça muito seguro, uma questão de carácter ou qualquer outra crença limitativa.
A memória transmitida pelos nossos pais, com o objectivo de nos proteger de coisas que ameaçam a integridade física é o que nos permite aprender a conhecer as limitações do corpo físico. Mas vêm acompanhadas das memórias pessoais deles, que não correspondem a uma experiência pessoal e, no entanto, tendem a moldá-la.
Alerta-nos para muitas situações desfavoráveis, possibilitando escolhas mais avisadas, mas mesmo assim não é tudo o que somos. Há infinitas possibilidades para viver, experimentar, gozar.
Confiar demasiado na memória ou insistir que é ali e apenas ali que devemos ficar é uma negação do possível. É uma afirmação do nosso medo de avançar. E a recusa de partirmos em busca do que desejamos.
Uma ferramenta é útil quando a dominamos e usamos para o que foi desenhada. Mas não nos passa pela cabeça definirmo-nos como um martelo ou um alicate e andar por aí a dizer que somos um ou outro. Podemos usá-los para atingir o que queremos e fazê-lo de forma criativa, mas isso é apenas uma gota num oceano.
A memória regista, não cria, não muda. Mas influencia determinantemente as nossas escolhas e decisões. É importante conhecê-la e dominar as suas qualidades, mas não viver em função dela. É apenas parte da nossa colecção de manuais de vida, não a vida toda.
Os seus registos incluem muito medo, todo passado. Não é necessário projectá-lo também no futuro, um exercício que não nos tira da cepa torta.
Se a memória passa de aviso a medo, são dois alertas que recebemos para perceber que estamos a afastar-nos do que realmente queremos. Há sempre outra forma de ver as coisas e, sobretudo, muito mais a viver além das encolhas do medo. Sem outros limites que os da coragem e da vontade. Acção!