Passam-se anos sem que a gente diga o que é realmente importante às pessoas de quem gosta e a quem ama como é difícil amar outras pessoas.
Falo, claro, do meu pai, na foto. A gente tem o amor dos pais por garantido e raramente se dá ao trabalho de dizer que esse amor é retribuído.
Hoje, no dia do seu aniversário, aproveito para dizer que o amo - e acho que é a primeira vez, que a preguiça dos filhos na verbalização destas coisas é sempre inacreditável.
Amo-o sobretudo pela capacidade que ele tem de amar, sempre a dar a impressão de durão distraído que não liga a essas coisas.
A verdade é que ama e amou sempre a sua família de seis mulheres tagarelas, rezingonas, com mau feitio, tolas, irrequietas, inconformadas, exigentes, com propensão para o drama, para as grandes paixões e para os sonhos impossíveis.
Dele herdei as mãos fadadas para o desenho e para a pintura, os rompantes de mau génio e a teimosia. E muitas outras coisas em que, com o tempo, nos reconhecemos nos pais.
Lembro-me da expressão da cara dele quando, depois de horas perdida no mar ao largo de Inhambane, me viu chegar finalmente à ponte de cais no navio da guarda costeira.
Lembro-me das caçadas à noite, sentada ao lado dele no Land Rover, do chá gelado e dos bolinhos de arroz quando amanhecia e se parava no meio de uma picada. Lembro-me de o espreitar de madrugada, quando saía e ainda toda a gente dormia. Da carrinha azul que arranjou para nos levar a nós e às outras crianças para a escola que ficava a quatro quilómetros todos os dias. Dos passeios pela praia a apanhar conchas e do cheiro do líquido com que o ajudávamos a limpar a colecção que ocupava quase todos os móveis do escritório. Das saudades que até davam vontade de chorar quando esteve colocado no Norte de Moçambique e longe de nós.
Lembro-me sempre de imensas coisas e hoje em especial, porque faz anos e estou à espera de o ver online, pela webcam do portátil, para lhe dar os parabéns (não julgues que te escapas).
Feliz aniversário, Pa!
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