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quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

onde está a indignação?

"ninguém?" by MMF

Talvez seja só eu a ver estas coisas de se 'comercializarem' pessoas em casamentos, ofertas de homens e mulheres para namoros e, agora, cinco garotas por agricultor... Será isto uma actividade legal porque as pessoas se oferecem e dão o seu consentimento? Só por isso se colocam em situações indignas à frente de um país inteiro? Será realmente aceitável permitir que as pessoas se exponham à escolha dos outros, se submetam a argumentos para as filmagens e depois façam ao vivo aquilo que noutras circunstâncias seria um atentado ao pudor, proxenetismo e comércio de sexo e intimidades?
Será que a SIC acredita realmente que está a transmitir um programa sério? Ou a tentar fazer-nos acreditar que acredita em mais do que simples subidas de audiências?
A ser verdade, também ninguém acha estranho que não apareçam casais homossexuais, pessoas de outras raças que não apenas brancos ou praticamente brancos? E ninguém produz um comentário indignado à completa alarvice machista da maioria dos concorrentes masculinos?
O aspecto físico das pessoas conta, claro, mas alguns comentários dos candidatos sobre as suas parceiras fazem-nos pensar de imediato no número de mulheres assassinadas pelas suas contrapartes 'amorosas' que tão gritantes protestos têm levantado ultimamente. E nenhum para estes programas miseráveis que a televisão inaugurada pelo príncipe dos presidentes desta república? Mais uma vez, não acham isso estranho? 
Onde está a indignação de políticos e opinosos quando estas coisas se passam à frente dos nossos narizes e depois vêm filosofar sobre o que está mal na violência sobre as mulheres (e não só), a exigir que se encontrem melhores e maiores formas de as evitar?
Não vêem televisão e por isso não têm consciência das receitas que se alardeiam todos os dias a consolidar os mais tristes e miseráveis conceitos sobre as relações entre pessoas?
Em empresas de entretenimento que se arvoram em órgãos de comunicação social, onde nas redacções as mulheres ganham maioritariamente menos do que os homens, não me espanta que a carneiragem e as exigências do poder patriarcal se façam sentir sobre os seus submetidos. 
Mas não há ninguém, ninguém mesmo que se revolte, se indigne ou, simplesmente, se espante com este espectáculo lamentável que, para ser mais certeiro, passa antes do jantar e antes da família depositar os seus rebentos, sãos e salvos, na cama?
Quem sois vós, afinal? Onde estão as pessoas de bem nestas alturas e antes dos jamaicas e dos números de vítimas chegarem aos ecrãs? Esperava melhor, confesso.

quarta-feira, 6 de setembro de 2017

há coisas a avancar

(foto daqui)


Há coisas que avancam em Cascais. Avancar é um verbo novo, desses que fica em terra de ninguém e que não implica nem compromete grande coisa. Avancar, avancamos todos, não importa em que direcção, com que intensidade, profundidade e consequências. 
O que importa é avancar. Dar a ideia de que estamos todos em movimento, mesmo que seja para o precipício dos efeitos menos desejáveis. E quem avanca a mais não é obrigado. Não se tortura com estados de consciência, com problemas varridos para debaixo do tapete, com cheias, tempestades e outras calamidades. 
Avancamos todos para o universo das facilidades, da megalomania do betão e do cimento. Dos parques de estacionamento impostos a quem tem direito a ter carro mas não a um espaço livre para o estacionar. Ao enxotamento dos cascalenses para a periferia do concelho para que os turistas possam beneficiar da vista e das bicas super modernas, ao mesmo tempo que compram souvenires fabricados a Oriente.
À universalíssima água de todos nós, vendida a peso de ouro (ora cá está a explicação para tantos ricos e famosos aqui assentarem arraiais). Querem água à borla? Vão para os chuveiros das praias, que já estão pagos com as taxas municipais e também servem para limpar as caravelas portuguesas que se agarram à pele dos banhistas de Carcavelos. Há gente mesmo ignorante e incapaz de avancar...
Avanca-se sobretudo com múltiplos mega eventos em Setembro, a concorrer com a campanha eleitoral e a deixar-nos aturdidos com a oferta previamente paga pelo bolso de todos.
O que faz falta é avancar a malta. E quem avanca, seus males espanta.

domingo, 15 de novembro de 2015

(des)vantagens do terror

"Guernica" - Pablo Picasso

A pergunta necessária é: quem beneficia com o terror? A resposta lógica dificilmente será a do extremista perseguido e abatido pela polícia, por forças especiais em grutas miseráveis e isoladas, ou por drones comandados por satélite. Nem sequer os alegados estrategas e financiadores apanhados na controladíssima rede fiscal e bancária do planeta.
Portanto, quem beneficia realmente com a propaganda do terror. Serão extremistas, sim, mas os que têm em mente o controlo absoluto de pessoas e bens, esses em cuja ilusão o poder é uma propriedade muito acima do que o seu corpo e a sua vida alguma vez poderão gozar.
O cidadão comum é apanhado na rede do medo induzido, que o fará concordar com as medidas extraordinárias de uma restrição cada vez maior das suas liberdades, em nome de uma guerra santa que não é sua, mas de quem apenas deseja acumular mais poder e riqueza.
As guerras nunca foram santas, até porque as duas palavras, em perfeita lógica, se contradizem. Ou se tem uma guerra, ou se tem a santidade. E, como já dizia Giordano Bruno, a batalha entre a luz e a escuridão tem um desfecho lógico e inevitável, pois a luz acabará sempre com a escuridão, sendo a contrária impossível.
Os imperadores do poder e do terror sonham, por isso, com uma glória muito aquém das suas possibilidades. O que fazem tem instantes contados, mesmo que a sua crença contrarie as leis fundamentais do universo.
Graças aos extraordinários meios de comunicação que lhes proporciona a tecnologia, a sua propaganda chega à maioria esmagadora dos habitantes do planeta. A grande ópera mundial da tragédia está sempre disponível e a ser alimentada. O que pode ser mais importante do que um grande perigo, um alerta internacional, um acidente de proporções gigantescas?
A consciência de que há vida além da tragédia aparece ofuscada. Mas é uma chama que não se apaga. Enquanto estamos vivos podemos sempre recuperá-la e restabelecer a luz e a lógica das nossas propostas.
Os grandes senhores, como a escuridão, têm instantes contados e, depois deles, a vida segue. A ópera deixa cair o pano e podemos regressar a casa para o sossego das nossas rotinas.
Mais ainda: há um instante também para o terror atingir o seu ponto máximo e provocar uma reacção de sentido inverso em cada um de nós. O excesso de propaganda acelera todos os dias esse sábio mecanismo de defesa em todos os nós.
Há vida além do terror e todos nós o sabemos. O momento em que assumimos isso conscientemente é que difere um pouquinho de pessoa para pessoa. Mas vamos sempre a tempo.



quarta-feira, 22 de maio de 2013

propaganda e justiça nas autarquias

(Ilustração daqui)

Quando surge oposição, a primeira coisa que os regimes totalitaristas fazem é criar mais uma dezena de núcleos de opositores, só para confundir o povo. É o que parece estar a acontecer agora em Cascais.
A seguir ao lançamento da primeira candidatura e do respectivo movimento, ainda o ano passado, o importante foi lançar mais movimentos aliados às candidaturas, ainda que um candidato apoiado por um dos partidos da situação não possa ser considerado um movimento senão em termos de propaganda.
Também para evitar originalidades, todas as candidaturas optaram por incluir o nome de Cascais na sua propaganda e, depois do Ser Cascais, apareceram o Viva Cascais, Liderar Cascais, Cascais para todos e Todos por Cascais. Assim, não há dúvida que os cidadãos poderão distinguir inequivocamente o movimento que mais lhes enche as medidas.
Os socialistas, que este ano apresentam como líder um homem de direita e com muitos antagonistas óbvios no concelho, optaram por o apresentar quase com honras de estadista, numa cerimónia apadrinhada pelo líder do partido que, por mero acaso, está casado com uma funcionária da associação de farmácias que o candidato dirigiu durante décadas, e um general e ex-presidente que, se até agora ainda gozava de uma fama de razoável honestidade, já a perdeu num qualquer jogo de interesses que o levou a aceitar a tarefa de mandatar a campanha de um lobo em pele de cordeiro.
A CDU, que nunca teve em Cascais um berço natural para as suas lutas de classe, muito embora tivessem saído das casas das tias e dos tios da linha muitos dos membros do partido comunista, que também escolheram o concelho para viver, reclama com naturalidade a terra a si e a todos. Com alguma coerência, apesar de tudo.
Outros, mais indecisos, bateram com a porta nos respectivos partidos de direita, engrossaram as fileiras dos independentes, arrependeram-se e lançam agora o Todos por Cascais e seja o que Deus quiser. Amén.
Os bloquistas, que manobraram aqui e ali para se aliarem a alguns independentes, ainda não enterraram o seu estandarte em nenhuma colina local, pairando ainda a dúvida sobre as suas pretensões a concorrer à autarquia isoladamente. A ver vamos com que linhas se cozem até ao anúncio da data das eleições e apresentação das candidaturas.
A coligação PSD/PP, a tentar fugir à péssima imagem criada por este governo, investiu num Viva Cascais populista e demagógico, de campanha inteiramente paga à custa dos contribuintes, cascalenses e não só, sem que nada nem ninguém se lhes oponha. Sem que voz alguma ou estranheza se manifeste. Será que acreditam mesmo que os votos vão continuar a beneficiar o poder e, portanto, mais vale não atrair as más intenções dos poderosos? Seja como for, custa ver os dinheiros públicos gastos em campanha e não em benefício da população e da sua qualidade de vida, como em qualquer república bananeira com vocação para alojar paraísos fiscais.
Confusão assente, a verdade é só uma: os portugueses não gostam dos partidos, por isso este travestimento em movimentos que até podem induzir honestos votantes a pôr a cruzinha nos responsáveis pelo descalabro que se instalou a seguir ao 25 de Abril. Porque a verdade é que, afastadas as grandes famílias no poder durante o regime salazarista, foram os seus primos direitos e tortos que organizaram as novas forças políticas e concertaram o novo regime de exploração popular.
Tão bem o fizeram, que os verdadeiros candidatos independentes têm de gastar do seu dinheiro até ao anúncio da data das eleições pela CNE para se constituírem como uma candidatura e poderem então apresentar contas (sem retroactivos nem reembolsos) do investimento que fizeram para representar os outros cidadãos. E de todas as candidaturas actuais para Cascais, apenas uma (Isabel Magalhães/SerCascais), paga do seu bolso e de nenhuma máquina partidária as suas contas, por sua conta e risco.
Como a justiça é um conceito difícil de abranger, esses mesmos independentes pagam tudo com IVA a 23%, de que os partidos estão isentos nas suas despesas de campanha. Depois dos votos, todos os candidatos repartem os 25% igualmente e os restantes 75% da subvenção estatal para este fim são distribuídos na proporção dos resultados eleitorais obtidos para a assembleia municipal. Atenção, portanto, aos votos brancos que depositam nas urnas e que contam para o indevido proveito dos partidos.
Em 2009 a abstenção no concelho de Cascais foi de 55,93%, ou seja, em 160.300 eleitores inscritos, menos de metade deixou o dinheiro dos seus impostos e o seu destino entregue a pessoas que obtiveram apenas 37.456 votos (CDS/PP), 18.835 (PS), 6.498 (PCP/PEV), 4,426 (BE), 493 (PPM), 310 (PCTP/MRPP), 286 (PNR).
Em abono da verdade, se o mesmo número de pessoas que se manifestou nos últimos protestos contra a situação sair da cadeira para ir votar em Cascais, as probabilidades de mudar alguma coisa são excelentes, apesar da campanha maciça de desinformação e de dispersão dos média, que se concentra em aterrorizar os cidadãos para que não percebam que são roubados por pessoas a quem pagam para gerir o seu dinheiro em forma de serviços públicos de que são beneficiários e nunca devedores.