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quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

coisas do mercúrio



Deve ser do mercúrio retrógrado, que possívelmente afecta mais os meus neurónios que os dos comentadores políticos. O certo é que achei toda a cerimónia de posse triste, triste, triste. Se me tivessem dito que era um velório, tinha acreditado, juro que tinha.
E os comentadores, numa excitação, a falarem do que poderá ou não mudar com Obama. Para já, o homem não mudou coisa nenhuma. As pessoas sim, mudaram. Tanto mudaram que o puseram lá. Será isto difícil de perceber?
Em vez de alegria, vi muita gente taciturna e muita invocação de Deus à maneira das igrejas evangélicas norte-americanas, o que só me fez pensar o que vai de facto mudar, e se calhar para pior, com tanto espírito religioso à solta pela nação mais poderosa do mundo.
Porque a verdade é que nada há de inovador e revolucionário nessas igrejas e nas atitudes por elas moldadas. Será que nos preparamos para mais uns valentes retrocessos sociais em nome do que é bíblico e rígido da fé cega da maioria dos crentes norte-americanos?
Depois, até parece que Deus prometeu a liberdade apenas aos negros, especialmente aos da América do Norte. E que a constituição norte-americana de repente virou verdade porque se elegeu o primeiro presidente negro dos Estados Unidos.
Até a "tolerância" apregoada me fez arrepios. Não desejo ser tolerada, pelo amor da santa...
E os jornalistas a insistir no registo de excitação e entusiasmo, que não vi em lugar nenhum. Deve ter sido o mercúrio retrógrado...

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

entre extremistas

Um novo ataque terrorista em Bombaim faz as parangonas dos meios de comunicação social em todo o mundo. Entre a crise provocada pela ditadura da economia e estes actos igualmente extremistas, há gente anónima que tenta manter as suas vidas a um ritmo normal, nesta guerra de poderes que cilindra inocentes.
Não há, contudo, nada de inocente no massacre aparentemente aleatório entre estes dois extremismos: o da voraz economia orientada para a exploração intensiva de todos os recursos humanos e materiais, e o da alucinada resposta de terroristas, nacionalistas ou lá o que valha.
Afectam-se vidas e felicidades em nome de ideais que não são, felizmente, os da maioria das pessoas. A vida continua longe da luta de poder e cabe-nos a nós, gente anónima, prosseguir as nossas vidas longe dos conflitos megalómanos criados por quem, com toda a certeza, não tem tempo a perder com as pequenas alegrias e conquistas de uma vida normal.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

qual crise qual nada

Ai a crise, ai a guerra...
Que seria da economia sem uma guerra?
Dos transportes ao fardamento, manutenção, alimentação, alojamento, armamento, IT e engenharia, uma guerra é um maná para os negócios.
E depois da guerra, a reconstrução continua a ser uma boa oportunidade de negócios.
Quando a economia está boa, não são precisas guerras.
Não sei para que é tanto alarido quando tudo se planeia tão cuidadosamente em torno das melhoras ocasiões para fazer dinheiro.

domingo, 21 de setembro de 2008

colonização do império

No passado dia 1 de Setembro, o canal de televisão britânico Channel 4 transmitiu o documentário "Undercover Mosque: The Return". Uma repórter muçulmana, com uma câmara escondida, dirigiu-se à maior mesquita londrina, em Regent's Park, para se juntar ao grupo de mulheres que ali assiste regularmente à cerimónia religiosa numa galeria separada dos homens. A seguir, horas de doutrinação, com Amira, uma muçulmana educada na Arábia Saudita, a instigar simplesmente à morte de todos os que estão contra o Islão - cristãos, que segundo ela são repugnantes, mulheres adúlteras, homossexuais e pessoas que abandonam a fé muçulmana. "Kill, kill, kill", é a frase com que a doutrinadora termina cada explicação e exemplo.
O documentário mostra também o acolhimento, na mesma mesquita, de grupos de jovens e pessoas de outros credos, no âmbito de um programa que teve o aplauso do governo britânico e destaque nos principais meios de comunicação social do país. A iniciativa destina-se a dar a conhecer o Islão aos não muçulmanos para uma melhor integração entre as diferentes comunidades. A seguir às sessões, o discurso da doutrinadora muda radicalmente e volta ao original catecismo extremista e instigador de violência.
O documentário é uma visão parcial e desconcertante da Inglaterra de hoje, em que vários grupos religiosos, que não apenas os muçulmanos, ao abrigo das estritas leis britânicas de defesa dos direitos à liberdade de culto e de minorias, usam esses mesmo direitos para se instalar na Grã-Bretanha, doutrinando e instigando contra as liberdades de outras minorias.
Igrejas de todas as denominações proliferam por todo todo o lado. Há uma constante circulação de grupos, missionários e crentes que, com vistos de estudantes, multiplicam os seus números com imigrantes de todas as nacionalidades e de todos os cantos do mundo. Não se sendo britânico ou europeu, os estudantes só podem trabalhar um máximo de 20 horas semanais, cobrindo os grupos e comunidades religiosas parte das suas necessidades básicas com alojamento mais barato e trabalho prestado dentro das comunidades, muitas vezes em condições muito pouco dignas, mas validadas pelo "espírito de missão".
O afluxo de imigrantes não qualificados, tornado em mão-de-obra barata, tem as simpatias das grandes cadeias retalhistas do Reino Unido, que o usam como uma "best practise" de "management" e as tornam mais competitivas em relação ao comércio tradicional. No entanto, a força de trabalho barato que parecia ser um "eldorado" para economia britânica já a sentir os efeitos da recessão global, está a revelar-se um acelerador da crise económica e das mudanças irreversíveis da nova ordem mundial.
Quem ganha pouco também compra pouco e isso não se aplica apenas aos imigrantes. Os cidadãos britânicos com poucas qualificações vêm-se agora obrigados a competir em termos de igualdade com a mão-de-obra barata e também estão a perder o seu poder de compra, obrigando as empresas a ainda maiores medidas de contenção para manter os seus lucros à tona.
Entre a religião e a economia, o Império Britânico enfrenta hoje uma das maiores vagas colonizadoras de que há memória, em consequência directa das conquistas sociais das últimas décadas.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

pequenos sinais de perigo

Cartoon de Paresh Nath, «National Herald»

A nossa memória distrai-se com tanta notícia, com tanto acontecimento, com tanto telejornal.
O certo é que a recém-declarada independência do Kosovo pode bem ser também o mais claro sinal de que o mundo se prepara para uma nova clivagem, com os EUA e a UE a tomar partido pelo Kosovo, e a Rússia e a China a torcer o nariz e a afirmar que a lei não é apenas a que o Ocidente entende.
E aqui a Europa tem de se lembrar que todos os seus conflitos maiores começaram exactamente nos Balcãs. As duas Grandes Guerras tiveram origem em lutas intestinas naquela região e não está fora de causa que esta questão seja mais uma chama perto do rastilho.
Até porque a economia europeia está a precisar de uma sacudidela e toda a gente sabe, ou devia saber, que as guerras não se fazem porque alguém decide que uma fronteira não está bem desenhada assim e ficaria muito melhor assado. Não, as guerras não acontecem assim.
Por trás de uma guerra está o imenso dinheiro necessário para a iniciar, as inúmeras indústrias que de repente recebem um incremento de actividade, das águas engarrafadas às simples embalagens plásticas para todo o tipo de produtos, do armamento às peças para camas, carros, tendas, refeitórios, estradas, pontes, abrigos, medicamentos, hospitais e organizações não-governamentais.
E depois da guerra, que destrói gente mas, sobretudo, destrói construções, equipamentos e infra-estruturas, adivinhem quem investe e reconstrói e permanece nos locais como accionista...
Portanto, além da sacudidela de que a Europa precisa, há que considerar as sacudidelas da Rússia, que tem de se reorganizar também, da China, que quer ser vista e ouvida, além dos EUA, que têm de arranjar uma guerra mais próxima que a do Médio Oriente para fazer dinheiro.
A questão agora é: voltamos à guerra fria, ou andamos à estalada a sério? O que irá render mais a curto, a médio e a longo prazo?
Entristeço-me pelos jovens de hoje, que entre o desemprego e uma carreira de armas forçada, numa era em que as seguradoras tendem a substituir a responsabilidade civil dos estados, podem ter a certeza que nunca ninguém aceitará fazer-lhes um seguro de vida ou de saúde. A geração a seguir poderá, no entanto, colher os frutos dos conflitos e esbanjá-los numa segunda versão da dolce vita.